Vamos voltar à creche… E agora?
“E quando a tempestade tiver passado, não te vais lembrar de como conseguiste passar por ela, de como conseguiste sobreviver. Não terás nem a certeza de que a tempestade realmente acabou. Mas uma coisa é certa. Quando saires da tempestade, não serás a mesma pessoa que entrou. É disso que se trata a tempestade.” Haruki Murakami
Quanto mais fortes forem as “fundações” da casa, melhor será o desenvolvimento do seu bebé e maiores hipóteses de ele vir a ser a melhor versão dele próprio!
Eu e a minha equipa temos como preocupação máxima ajudar os bebés de hoje, que serão os futuros adultos, e os seus pais, que tanto querem vê-los crescer sadios e felizes! Por isso, hoje partilho convosco a nossa reflexão acerca da abertura das creches programada para o próximo dia 18 de Maio e a forma como essa abertura decorrerá segundo as diretivas da Direção Geral de Saúde (DGS).
Imagino que se sinta preocupado(a) e ansioso(a) com esta situação, sem saber bem qual a decisão que deve tomar. Neste sentido, é importante refletir acerca de como gerir normas tão específicas com crianças tão pequeninas. Tenho uma clara noção que a reabertura das creches pode ser importante para muitas famílias que não têm a possibilidade de ficar com os filhos em casa ou que têm dificuldades económicas e precisam de algum tipo de apoio.
Gostaria de reforçar a mensagem clara e inequívoca do quanto é urgente os pais terem cada vez mais a noção de como é importante estar atento e fomentar o desenvolvimento cerebral dos seus bebés. De se sincronizarem com eles para estabelecerem uma vinculação segura e sadia e aprenderem a voltar ao básico, que não é mais do que ouvirem os seus próprios instintos e os sinais e instintos dos bebés como forma de sobrevivência, mas também de os ajudarem a autoregularem-se do modo mais natural e respeitador possível do seu cérebro.
A ciência é clara – o cérebro do bebé não se desenvolve de forma saudável sem aquilo que é o “dar e receber” entre o bebé e o seu cuidador preferencial. E com desenvolvimento cerebral quero dizer os bebés tornarem-se em adultos felizes e saudáveis no futuro. Sem os pilares do cuidado afetivo do “outro”, é impossível conseguir este objetivo.
Porque é que vos falo disto novamente? Porque estamos perante a reabertura das creches sem se considerar previamente quais seriam as melhores soluções de compromisso para, por um lado, assegurar a proteção das crianças e minimizar a propagação do vírus e, por outro, sem prejudicar o seu desenvolvimento.
É sugerido que as mantenham com distanciamento social, o que só é possível se as crianças não interagirem, que não levem os seus próprios brinquedos (nomeadamente aqueles de que precisam para adormecer de forma tranquila), que não partilhem, que estejam de costas uns para os outros…mas não será tudo isso exatamente o oposto do cuidado básico e imprescindível ao desenvolvimento cerebral e pessoal de cada indivíduo em formação?
A vida mudou. Nós mudamos. O mundo mudou. E enquanto a sociedade em geral e o Estado de Direito não entenderem este facto e não repensarem o modelo profissional dos pais e o modelo educativo das crianças, desde o nascimento até à inserção no mercado de trabalho, caminharemos para o desastre emocional, funcional e geral da nossa sociedade nas próximas décadas. Estamos numa tentativa desesperada de voltar ao “novo normal” quando o “novo normal” não existe e quando deveríamos estar focados em criar novos modelos de funcionamento social mais respeitadores dos bebés e crianças, que, como diz o povo, “são o nosso futuro”. Modelos respeitadores das relações entre os bebés e os seus pais, entre eles licenças de maternidade mais prolongadas, horários de trabalho mais flexíveis, mais teletrabalho, etc.
Será que precisamos mesmo de continuar a trabalhar fora de casa, 40 horas semanais, poluindo o planeta com engarrafamentos e gazes de tubos de escape, e roubando horas preciosas de conexão aos nossos filhos?
Não nos concentraríamos muito mais se pudéssemos dedicarmo-nos às nossas profissões a partir do nosso lar e contando com o apoio das chamadas “bolhas sociais, previamente estudadas e planeadas, criando e apoiando novas plataformas educativas, com a ajuda de grupos de suporte aos pais por via do apoio de pessoas reformadas e ainda ativas, de amigos ou vizinhos com crianças da mesma idade, pessoas de família ou amas? E tudo isto sustentado pelo recriar de um novo modelo de vida económico, social e familiar. Com a ajuda do Estado, sim.
Sobreviveremos melhor com mais conexão, mesmo isolados, do que com mais isolamento quando estamos juntos.